O Brasil é responsável por não investigar os crimes cometidos contra Vladimir Herzog




Vladimir Herzog (Osijek, Reino da Iugoslávia, 27 de junho de 1937 — São Paulo, 25 de outubro de 1975), foi um jornalista, professor e dramaturgo brasileiro.

Herzog nasceu na cidade de Osijek, na então Iugoslávia, em 1937, filho de um casal de origem judaica. Durante a Segunda Guerra Mundial, para escapar do antissemitismo praticado pelo estado fantoche da Croácia, então controlado pela Alemanha Nazista, a família fugiu primeiramente para a Itália, onde viveu clandestinamente até imigrar para o Brasil.

Naturalizado brasileiro, Vladimir também tinha paixão pela fotografia, atividade que exercia por conta de seus projetos com o cinema. Passou a assinar "Vladimir" por considerar que seu nome soasse exótico para os brasileiros. Na década de 1970, assumiu a direção do departamento de telejornalismo da TV Cultura e também foi professor de jornalismo na Escola de Comunicações e Artes(ECA) da Universidade de São Paulo (USP).

O nome de Vladimir tornou-se central no movimento pela restauração da democracia no país após 1964. Militante do Partido Comunista Brasileiro, foi torturado e assassinado pelo regime militar brasileiro nas instalações do DOI-CODI, no quartel-general do II Exército, no município de São Paulo, após ter se apresentado voluntariamente ao órgão para "prestar esclarecimentos" sobre suas "ligações e atividades criminosas"

No julgamento notificado hoje, em San José, Costa Rica, 4 de julho de 2018, a Corte Interamericana de Direitos Humanos ("Corte IDH" ou "Tribunal") decidiu que o Estado brasileiro é responsável pela falta de investigação, de julgamento e de punição dos responsáveis pela tortura e pelo assassinato do jornalista Vladimir Herzog, bem como pela aplicação da Lei nº 6.683/79 ("Lei de Anistia") neste caso. A Corte Interamericana também responsabilizou o Estado pela violação dos direitos a conhecer a verdade e à integridade pessoal dos familiares de Vladimir Herzog.

Em 25 de outubro de 1975, o Sr. Herzog foi privado de sua liberdade, interrogado, torturado e, finalmente, assassinado em um contexto de ataques sistemáticos e generalizados contra civis considerados "opositores" da ditadura brasileira, em especial contra jornalistas e membros do Partido Comunista Brasileiro. Nesse mesmo dia, o II Comando do Exército divulgou a versão oficial dos fatos, afirmando que Vladimir Herzog havia cometido suicídio. Em 1975, a Justiça Militar realizou uma investigação que confirmou a versão do suicídio. Em 1992, as autoridades brasileiras iniciaram uma nova investigação, mas esta foi arquivada em aplicação da referida Lei de Anistia.

Em 2007, após a publicação do relatório oficial da "Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos", apresentou-se um novo pedido de investigação ao Ministério Público Federal. Entretanto, em 9 janeiro de 2009, o referido pedido foi arquivado pelo Poder Judiciário com base na: (i) existência de coisa julgada, em razão da decisão proferida em 1992 com base na lei de anistia; (ii) ausência de tipificação dos crimes contra a humanidade na lei brasileira à época dos fatos; e (iii) prescrição da ação penal em relação aos tipos penais considerados aplicáveis ao caso. 

Durante o processo perante a Corte Interamericana, o Brasil reconheceu que a conduta arbitrária do Estado de prisão, tortura e morte de Vladimir Herzog havia causado severa dor à família, reconhecendo sua responsabilidade pela violação do artigo 5.1 Convenção Americana.

Em sua Sentença, a Corte IDH determinou que os fatos ocorridos contra Vladimir Herzog devem ser considerados crime contra a humanidade, de acordo com a definição dada pelo Direito Internacional. Em vista do exposto, o Tribunal concluiu que o Estado não pode invocar a existência da figura da prescrição ou aplicar o princípio ne bis in idem, a lei de anistia ou qualquer outra disposição semelhante ou excludente de responsabilidade para escusar-se de seu dever de investigar e punir os responsáveis.

A Corte Interamericana concluiu que, devido à falta de investigação, bem como de julgamento e punição dos responsáveis pela tortura e pelo assassinato de Vladimir Herzog, cometidos em um contexto de ataques sistemáticos e generalizados contra civis, o Brasil violou os direitos às garantias judiciais e à proteção judicial de Zora, Clarice, André e Ivo Herzog, estabelecidos nos artigos 8 e 25 da Convenção Americana, em relação com a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura. Além disso, a Corte concluiu que o Brasil não cumpriu sua obrigação de adaptar sua legislação interna à Convenção, em virtude da aplicação da Lei da Anistia e de outras causas de exclusão de responsabilidade proibidas pelo Direito Internacional, descumprindo assim o artigo 2 da Convenção Americana. 

Além disso, a Corte Interamericana concluiu que, embora o Brasil tenha empreendido diversos esforços para realizar o direito à verdade da família do Sr. Herzog e da sociedade em geral, a falta de esclarecimento judicial, a ausência de punições individuais em relação à tortura e ao assassinato de Vladimir Herzog, e a recusa em apresentar informações e fornecer acesso aos arquivos militares da época dos fatos violaram o direito de conhecer a verdade em detrimento de Zora, Clarice, André e Ivo Herzog, estabelecido nos artigos 8 e 25 da Convenção Americana.

Em virtude dessas violações de direitos humanos, a Corte ordenou várias medidas de reparação, incluindo aquelas destinadas a reiniciar, com a devida diligência, a investigação e o processo penal relativos aos eventos ocorridos em 25 de outubro de 1975, para identificar, processar e, se for o caso, punir os responsáveis pela tortura e pelo assassinato de Vladimir Herzog. A Corte também determinou que o Estado brasileiro deve adotar as medidas mais apropriadas, de acordo com suas instituições, para que se reconheça, sem exceções, a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade e dos crimes internacionais.

O presente comunicado foi redigido pela Secretaria da Corte Interamericana de Direitos Humanos, sendo de responsabilidade exclusiva desta. Para maiores informações, favor dirigir-se à página da Corte Interamericana em http://corteidh.or.cr/index.cfm ou enviar um e-mail dirigido ao Secretário Pablo Saavedra Alessandri para corteidh@corteidh.or.cr. Para o departamento de imprensa, por favor, contatar a Marta Cabrera Martín em prensa@corteidh.or.cr. As atividades da Corte podem ser acompanhadas no Facebook e no Twitter.  


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